Rita Botelho, 40 anos

Diagnosticada há 6 meses

_ Sintomas, Diagnóstico & Evolução:

- Quais os primeiros sinais que o fizeram pensar que alguma coisa diferente se passava?

O meu primeiro sintoma foi a dificuldade na dorsiflexão do pé direito, que fazia com que arrastasse o pé ao andar.  

- Pode descrever sucintamente o processo até obter o diagnóstico, dizendo quanto tempo terá demorado? 

Estive cerca de meio ano a arrastar o pé convencida que se tratava de uma lesão provocada pela prática de ténis. Quando percebi que não podia ser só uma lesão, fui à minha médica de família que me prescreveu um anti-inflamatório e encaminhou-me para Ortopedia. Pela lentidão do sistema público e por me sentir bastante limitada e com outro tipo de problemas provocados pelo arrastar constante do pé (dores na lombar e inflamação nos músculos adutores da perna direita), recorri inicialmente ao ortopedista no privado e a partir daí andei de médico para médico e de exame em exame durante mais meio ano. Fiz TAC à coluna lombar, EMG ao Membro Inferior Direito, RM à coluna lombar, RM cerebral (prescrito por uma neurologista) bem como Fisioterapia e nada, ninguém sabia o que tinha. A primeira neurologista que consultei, apesar de não ser especialista em doenças do movimento, depois de saber que a RM cerebral não acusava nada, encaminhou um vídeo de mim a andar às suas colegas do hospital público que confirmaram o possível diagnóstico de Parkinson. No entanto, eu não voltei à sua consulta pois não recebi notícias sobre esse possível diagnóstico e parti do princípio que como a RM estava sem problemas, não deveria ser nada neurológico (na minha ignorância na altura).

Felizmente como todos esses médicos eram da mesma unidade hospitalar, acabaram por falar uns com os outros sobre o meu caso “inexplicável” e pediram-me para voltar à consulta de neurologista. A neurologista acabou por me encaminhar para o serviço público para uma especialista em doenças do movimento. Só quando voltei à neurologista, pela segunda vez a pedido do fisiatra, mencionei que a minha mãe tinha Parkinson pois até à data nunca me tinha ocorrido que pudesse ter a doença, por vários motivos: os meus sintomas são totalmente diferentes dos da minha mãe, por não ter tremores (acabaram por aparecer numa fase mais tardia) e pelo facto de ter 39 anos e não conhecer ninguém tão novo com Parkinson.  

- O que sentiu quando o médico lhe comunicou que tinha Parkinson? 

A primeira pessoa que na verdade me disse que deveria ter algum tipo de Parkinsonismo foi o meu Fisiatra numa consulta que aconteceu depois de duas semanas de fisioterapia sem qualquer resultado. Foi aí que pensei na minha mãe e “fiquei sem chão”. Apesar do Fisiatra ter tido o cuidado de me explicar a sua conclusão (que aconteceu depois da tal reunião com os outros médicos inclusive a Neurologista) e de ter desenhado esquemas e escrito umas palavras complicadas numa folha de papel, só chorava e tive a sensação de estar num mundo paralelo. Fui sozinha de carro para casa e quando cheguei a casa o meu marido pensava que tinha tido um acidente pois chorava sem parar e não dizia grande coisa. 

- Que explicações médicas recebeu sobre o facto de lhe ter sido diagnosticada esta doença?

Numa fase inicial, não me disseram que tinha Parkinson mas sim alguma forma de Parkinsonismo pois existem sintomas muito semelhantes para diferentes tipos de doenças do movimento. A primeira explicação foi o andar típico do Parkinsonismo a arrastar o pé juntamente com a falta de movimento do braço direito que não acompanhava o ritmo do andar. Claro que o facto da minha mãe ter Parkinson era também um forte indício. 

- As consultas médicas regulares dão-lhe as respostas/orientação que precisa?

Sim, tenho a sorte de estar a ser acompanhada agora por uma Neurologista interessada e receptiva às minhas opiniões e como eu pesquiso bastante sobre a doença, sinto que as nossas conversas são sempre interessantes. Aprendo com ela sobre as ferramentas farmacológicas para poder ter melhor qualidade de vida mas também me sinto apoiada na minha forma de lidar com a doença, o que é um factor extremamente importante para doentes com Parkinson. 

- Desde que foi diagnosticado, que evolução vê nos sintomas e no estado geral da sua saúde?

Eu costumo dizer que a pior fase da doença foi o ano em já tinha sintomas mas ninguém sabia a sua causa. Foi muito frustrante, gastei imenso dinheiro em exames e senti muito stress e isolamento. Acredito que tudo isso fez com que a doença tivesse acelerado mais do que devia durante esse período. A  partir do momento que fui diagnosticada só sinto melhorias mas estas não foram imediatas. O primeiro medicamento que tomei foi Rotigotina que me ajudou ligeiramente mas criou efeitos secundários muito chatos que podiam ter sido evitados. A  partir do momento que deixei a Rotigotina e comecei a tomar Levodopa, tenho sentido uma melhoria enorme que também tem sido bastante progressiva. Não só pelos efeitos secundários iniciais mas também porque tenho vindo progressivamente a adaptar a dose ideal bem como os horários ideais da toma do medicamento. Neste processo eu passei de deixar de poder escrever ao computador, trabalhar e exercitar para uma situação que me permite trabalhar, voltar ao ténis, conduzir etc. Quem tem como eu a mutação genética LRRK2 tem geralmente uma reação muito boa à levodopa e eu sinto isso. Estou a tomar uma dose considerada baixa e por isso tenho também alguns períodos off mas dentro dessas flutuações, consigo ter uma vida bem mais normal. 

 

_ Assimilação, Reação & Reorganização

- Como foi o seu processo de assimilação da notícia?

Fiquei em estado de choque no dia que recebi a notícia mas rapidamente encontrei a YPP  e percebi que não estava sozinha e que ter Parkinson não era o fim do mundo. 

- Quanto tempo demorou até contar à sua família e pessoas mais próximas e como se sentiu depois de o fazer?

Contei ao meu marido no dia em que recebi a notícia e nos dias seguintes aos amigos e família. Aprendi rapidamente que a pior coisa que podia fazer seria esconder/isolar-me e por isso levei esse ensinamento à letra. 

- Principais mudanças que fez na sua vida, desde que sabe que tem Parkinson

Por imposição da doença: que tipo de medicação faz? Faz algum tipo de exercício físico especial no dia-a-dia? Fez alterações nas rotinas ou nos planos familiares/profissionais?

Tomo 3 vezes Sinemet (25 carbidopa/ 100 levodopa) por dia de 4 em 4h (deixo o período final do dia em que tenho menos atividade para a fase mais off. Vou ao ginásio com um treinador pessoal que tem conhecimento das minhas limitações e objetivos. Trabalhamos muito o equilíbrio, dupla tarefa e rápida reação. Deixei de consumir a maior parte dos laticínios e tenho muito cuidado quando como proteínas para não comprometer a absorção da levodopa. Tenho uma alimentação saudável e equilibrada como já tinha anteriormente. 

Por sua iniciativa, com vista a uma melhor qualidade de vida: evitar situações de stress? Criar rotinas com família/amigos? Alterações do dia a dia profissional? 

Cortar situações de stress tem sido extremamente importante. Ao nível de trabalho, como tenho marca própria e produzo peças de joalharia, tive a capacidade e flexibilidade de mudar todos os aspectos do meu trabalho que me provocavam stress e ansiedade bem como ajustar horários. Ao nível de rotinas familiares, deixei de levar a minha filha à escola de manhã porque por vezes não tenho um sono descansado (outro sintoma da Parkinson) e o stress de sair exatamente à mesma hora de casa de manhã podia ser evitado. Tento combinar encontros com amigos a horas que sei que ainda não estou muito “presa” ou se não puder escolher, mudo excepcionalmente ligeiramente o horário das tomas para estar o mais funcional possível nos momentos de convívio. Crio tempo para exercício físico que passou a ser das ferramentas mais importantes para me sentir bem. 

- Que projetos gostaria de concretizar nos próximos anos? 

Não mudei nada em relação a projetos futuros, mas como há um fator de imprevisibilidade de como a doença vai evoluir, gostaria de viajar com a minha filha e o meu marido com mais frequência e aproveitar a vida ao máximo. A Parkinson deu-me uma coisa muito positiva: foco! Estou focada no que me faz verdadeiramente feliz e estou cada vez mais desligada de situações tóxicas e desnecessárias que não acrescentam nada de bom à minha vida nem à vida dos que me rodeiam.

 

Integração: de Parkie para Parkie

- O que diria a alguém que tivesse acabado de receber o diagnóstico?

Partilhar a notícia com quem gostamos e aceitar a doença é das coisas mais importantes. A partir daí é tirar um doutoramento sobre a Parkinson (just kidding mas a informação é tanta que é o que parece) e seguir em frente! É importante estar rodeada de pessoas positivas, informadas e com bom senso que nos possam apoiar e orientar a navegar neste mundo de informação sobre a doença de Parkinson. A YPP tem sido extremamente importante nesse aspeto. 

- O que acha que faz mais falta na comunidade, em termos de informação e de acompanhamento, para se sentir mais segurança e tranquilidade a viver com Parkinson? 

Falta conhecimento do corpo clínico ao nível dos cuidados primários para conseguirem detetar com mais celeridade casos de Parkinson, especialmente de Parkinson Precoce.  Quanto à sociedade em geral, é necessário mais abertura para acolher, integrar e compreender esta doença que pode ter tantos sintomas motores bem como não motores. É preciso quebrar estigmas e falar abertamente do Parkinson. 

- Se na sua zona de residência houvesse um centro onde pudesse conversar, ter orientação psicológica, praticar exercício específico para pessoas com Parkinson Precoce, assistir a sessões de esclarecimento, etc. consideraria uma mais-valia e teria interesse em participar? 

Certamente!

 - O que gostaria de acrescentar?

Depois do meu fisiatra me ter dito que devia ter algum tipo de Parkinsonismo, eu encontrei esta página da YPP e foi aqui que consegui perceber realmente o que tinha pois encontrei relatos de outras pessoas a descrever sintomas muito semelhantes ao que sentia na altura. Na segunda consulta de Neurologia, já sabia que tinha Parkinson mesmo antes da médica me dizer. Foi incrível o sentimento de não estar sozinha. Este grupo tem-me ajudado imenso a assimilar tudo o que implica viver com Parkinson e tem-me dado amigos para a vida.

Sinto-me imensamente grata. Obrigada!