
Cristiano Machado
Diagosticado aos 43 anos
SINTOMAS, DIAGNÓSTICO E EVOLUÇÃO
Quais os primeiros sinais que a(o) fizeram pensar que algo diferente se estava a passar? Pode descrever, sucintamente, o processo até à obtenção do diagnóstico? Quanto tempo demorou?
Olhando para trás, reconheço agora a menor força no braço e perna direita, que surgiram muitos meses antes de abril de 2022, quando comecei a sentir falta de destreza motora na mão direita.
Claro que, na altura, não me soou o alarme, pois poderia ser consequência das inflamações que tinha habitualmente nos canais cárpicos e nas articulações das mãos. Mas, em dezembro de 2022, comecei a notar alterações nos padrões musculares da coxa direita e decidi procurar o médico de família, que me encaminhou de imediato para as urgências do Hospital de Faro, para ser observado por um neurologista.
Nessa urgência, fui atendido pela médica que hoje me acompanha. Fez uma primeira avaliação clínica, seguida de RX, TAC e internamento. Depois de afastada a hipótese de AVC e de tumores no sistema nervoso central e periférico, foi realizada uma ressonância magnética à coluna, onde foram detetadas duas hérnias discais entre as vértebras C5-C6 e C4-C5, que exerciam pressão significativa sobre o canal medular. Curiosamente, recebi a chamada com os resultados desse exame e o agendamento com o neurocirurgião cerca de 10 minutos antes de iniciar a corrida de São Silvestre de Quarteira.
Nos primeiros dias de janeiro de 2023, foi-me sugerida uma cirurgia à C5-C6. No entanto, após a operação, os sintomas agravaram-se gradualmente e surgiu um tremor na mão direita. Consultei fisioterapeutas e neurologistas, e a hipótese da Doença de Parkinson foi ganhando força.
Infelizmente, nem a cintigrafia nem o exame genético realizado em setembro de 2023 me trouxeram uma confirmação absoluta.
Como se sentiu quando o médico lhe comunicou o diagnóstico da Doença de Parkinson?
Quando o primeiro médico se referiu à probabilidade de se tratar de Parkinson, pensei “Não será isso, mas por agora não encontro melhor explicação”.
Os diagnósticos seguintes, dados por outros médicos, vieram dar força e consistência a essa possibilidade.
Que explicações médicas lhe foram transmitidas sobre a Doença de Parkinson?
De forma gradual, fui recebendo informações sobre os sintomas mais comuns e a sua evolução, que podem levar anos, ou até décadas, a desenvolver-se.
Falaram-me também das terapêuticas mais comuns. E senti uma grande preocupação, por parte dos médicos, com o meu estado psicológico.
Houve algum profissional de saúde ou recurso informativo que lhe tenha sido particularmente útil nessa fase?
Como tive consultas com vários neurologistas nessa altura, é me difícil dizer quem disse o quê e qual foi a informação mais relevante. Talvez a formação em Psicologia que tive durante o meu percurso académico tenha ajudado a estruturar melhor a minha condição emocional.
Desde que foi diagnosticada(o), que alterações tem observado nos sintomas e no seu estado da sua saúde em geral?
Tenho sobretudo sintomas motores. A rigidez muscular nas pernas é o que mais tem progredido e o que me dificulta a marcha e a corrida. A mobilidade do braço e da mão direita – os primeiros sintomas – é provavelmente o que mais tem beneficiado com a terapêutica à base de Levodopa e agonistas.
As consultas médicas de acompanhamento em neurologia têm-lhe dado as respostas e orientações necessárias?
Neste momento, penso que nem eu nem a neurologista estamos satisfeitos com os resultados. Ainda há dúvidas quanto ao padrão aleatório dos sintomas e à resposta à terapêutica. Cabe-me aceitar que, perante tamanha complexidade, este será um processo longo.
ASSIMILAÇÃO, REAÇÃO E REORGANIZAÇÃO
Como foi o seu processo de assimilação e aceitação do diagnóstico?
Acredito que, para a maioria das pessoas, seja como ser apanhado de frente por um tsunami. Como nunca me deixei convencer com facilidade, vejo a aceitação do diagnostico como quem sabe que a maré inevitavelmente vai subir.
Quanto tempo demorou até partilhar o diagnóstico com os seus familiares mais próximos? Como se sentiu depois de o fazer?
Nunca guardei nada para mim. Sempre que me perguntaram, ou perguntam, “Como estás?” ou “O que tens?”, respondo com toda a frontalidade. Sejam familiares, amigos ou até desconhecidos.
Acredito que todos - com ou sem diagnóstico de Parkinson – precisamos de algum tempo para digerir a informação. Por isso, quanto mais cedo começar esse processo, mais cedo deixará de ser o assunto principal da minha vida social.
Em consequência do diagnóstico, que medicação está a fazer atualmente?
Estou a tomar Levodopa e três medicamentos agonistas.
Atualmente, pratica algum tipo de exercício físico especial ou adaptado?
Sim. O desporto sempre fez parte da minha vida. Neste momento, opto por exercícios mais controlados – por exemplo, patinar em vez de jogar hóquei em patins. Também faço passeios de bicicleta, treino de bicicleta estática, corrida, passadeira, musculação, bola de reflexos, natação… Não me inibido de fazer quase nada, apenas adapto cada atividade à minha condição do momento.
Desde que teve conhecimento do diagnóstico, quais as principais mudanças que introduziu na sua vida?
Além das tomas regulares da medicação, passei a ter rotinas mais rigorosas (horários certos para as refeições e o sono), controlo melhor os excessos alimentares, trabalho menos horas por dia e deixei de exercer uma atividade extraprofissional semanal.
Fez alterações nas suas rotinas ou nos seus planos familiares e profissionais?
Em termos de rotinas, sim.
Os planos foram relegados para o fim da lista das minhas prioridades.
Neste momento, foco-me no presente e no que posso fazer agora, sem pensar muito no passado nem no futuro.
Por sua iniciativa e com vista a uma melhor qualidade de vida, passou a lidar de forma diferente com situações de stress? Alterou as suas rotinas com os familiares? E com os amigos?
No geral, não mudei muita coisa. Talvez as circunstâncias tenham mudado a intensidade com que vivo certos momentos. Tento desfrutar mais dos bons momentos e desdramatizar os menos bons.
Que projetos ambiciona concretizar nos próximos anos?
Ver as minhas duas filhas jogar hóquei em patins na mesma equipa. Idealmente, no clube da terra onde trabalho.
INTEGRAÇÃO: DE PARKIE PARA PARKIE
O que diria a alguém que acabou de receber o diagnóstico?
Diria que, apesar do impacto inicial, as outras dimensões da nossa vida continuam a existir. Isto não é o fim do mundo. É apenas mais uma condição com a qual teremos de aprender a viver.
Do ponto de vista da informação e do acompanhamento, o que considera mais necessário existir na comunidade para se sentir mais segurança(o) e com maior tranquilidade para viver com o diagnóstico de Parkinson?
Sou controverso quanto à busca de informação. Procuro apenas o essencial, o estritamente necessário para a minha realidade naquele momento. Do meu ponto de vista, não interessa ter informação em excesso. Prefiro ter apenas o que é proporcional à minha necessidade em cada momento.
Contudo, parece-me essencial existir uma fonte de informação fiável e descomplicada, com conteúdos acessíveis a qualquer pessoa.
Se, na sua área de residência, existisse um Centro onde pudesse conversar, receber orientação psicológica, praticar exercício físico especialmente direcionado para pessoas com Parkinson Precoce, assistir a sessões de esclarecimento, etc., consideraria isso uma mais valia? Teria interesse em participar?
Sim, seria um recurso valioso e, com toda a certeza, participaria.
Gostaria de partilhar algum lema ou frase inspiradora que a(o) tenham ajudado nesta sua nova fase da vida? Alguma experiência marcante que tenha contribuído para a sua força e resiliência?
Numa entrevista, a presidente da Young Parkies Portugal disse que desde o seu diagnóstico “deixou de fazer fretes”.
Achei um bom princípio, e também uma boa desculpa para não fazer o que não nos motiva.
Gostaria de acrescentar mais alguma coisa?
Pessoalmente, não digo que tenho uma “doença”, mas sim que tenho uma “condição”.
Embora o significado seja o mesmo, a carga emocional é muito diferente. Acredito que pequenas alterações na forma como falamos e pensamos sobre a nossa situação podem ter um grande impacto na autoestima e autoimagem.